quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

A crise do Yogurt

Um pote de yogurt desnatado custa, em média, R$ 1,10. Como pretendo levar uma vida com mais saúde, incluí este elemento na minha dieta.
Há duas semanas, estive em um supermercado e, sem muitas variações, o preço do yogurt continuava o mesmo. Eu olhei, olhei...e, por uma questão de racionalização de orçamento, resolvi não comprar.
Ontem, estive no mesmo supermercado e, pasmem, este yogurt estava sendo vendido pela bagatela de R$ 0,58. Comprei dez potes.
Estava aqui pensando comigo: eu estava obedecendo à lei dos telejornais que indicam que o consumidor pesquise, pechinche e procure as melhores ofertas. Enquanto isso, o pobre alimento estava ali, naquela prateleira gelada, a espera de um dono. Posso até imaginar a ansiedade do mesmo cada vez que passava um possível comprador. Ele na geladeira e eu, durante este tempo, fui a diversos supermercados, comprei muitas coisas, fui ao dentista, à terapia, trabalhei todos os dias, andei de bicicleta...e o yogurt na mesma prateleira gelada.
Ontem, resolvi encarar a desvalorização e, finalmente, levei o produto pra casa.
Hoje, tentei degustá-lo.
Com todo o direito de quem é tratado como mercadoria, o yogurt azedou.
E o dono do supermercado, como todos os liberais e Deus, continuam esperando que as coisas se resolvam pelas leis do mercado.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

A Formiga e o Elefante

Como moro sobre um gigante formigueiro, é impossível não observar, em certos momentos, o comportamento das criaturas. Nas grandes tarefas, num carregamento de comida ou nos eventos que mobilizam um grande contingente, acho interessante como estas formigas, no vai e vem e ao passarem por outras, confirmam a sua existência ou tarefa em realização com um encontro de cabeças que, na minha imaginação, é acompanhado com algumas palavras de incentivo como, por exemplo, ‘vamos lá!’
Aplicando à minha realidade, malho na academia da empresa que trabalho que, por sinal, possui milhares de empregados. Como as pessoas não se conhecem, mas possuem, pelo menos na academia, um projeto comum, não é difícil perceber os rituais de confirmação de tarefa do formigueiro. Às vezes, também tenho a mesma sensação nos corredores com todos os ‘bom dias’, ‘boras’ ( junção de ‘vamos embora’), ‘ôpas’...
A mecanização é tão forte que sinto, muitas vezes, que sou parte e simples importância desta enorme engrenagem construída por formigas. Talvez por isso, sempre recusei a simples confirmação de existência ou tarefa, o que pode ser entendido como intromissão ou indiscrição por alguns. As informações que disponho sempre me confirmaram que ganho mais com a recusa.
Durante 2008, perdi duas colegas que trabalharam comigo.
Rose era mais uma formiga desta imensa empresa que, de repente, teve um enfarto fulminante. Morava sozinha e era admirada, inclusive, por sua elegância e discrição. Era tão discreta que tinha passado a semana com sensações ou dores estranhas e ninguém percebeu. Na noite da morte, foi de táxi sozinha e conseguiu discretamente ser atendida num dos melhores hospitais da cidade. No atendimento, ficou sozinha por alguns minutos para que o médico checasse algo fora da sala. Faleceu.
Tenho um ideal romântico de morte que inclui últimas palavras, suspiro e a confirmação de uma vida sentida ou da resistência da morte. Para isso é preciso platéia, direção, roteiro...Rose estava sozinha no fim!
A loucura disso é que fico pensando nos acasos, no motorista do táxi e nas conversas do caminho. Ainda fico pensando no ‘até amanhã’ que ela deu no dia anterior ou nos planos de atividades acertados para os próximos dias. Não vi nada disso porque trabalhávamos em salas diferentes.
Com a morte percebi duas coisas: a primeira que Rose era muito viva, pelo menos em mim e eu, apesar de conhecê-la há pouco tempo, sabia muito sobre ela. O que não acontecia com os outros colegas de trabalho.
A segunda coisa foi que, como no mundo das formigas, após a confirmação de não vida, a vida continuou para as outras e, rapidamente, esquecemos o que tínhamos vivido ou perdido. Lembro que, durante o funeral, as frases de confirmação eram ‘vamos em frente!’ e ‘pensemos que ela está de férias!’ (por sinal, as férias de Rose começariam na próxima segunda-feira.)
A outra colega chamava-se Lia que, professora como eu, caracterizava-se por ser viva e apaixonada. Era uma senhora, mãe e profissional que aparentava estar no fim de carreira, mas surpreendeu a todos ao passar no programa de mestrado em Geografia da UFPE e, por fim, em mais um concurso público para o CEFET, de instância federal.
Lia ria sempre e vibrava suas conquistas, tinha características do profissional que busco ser.
Entretanto, passou o primeiro semestre de 2008 lutando contra um câncer e faleceu em Julho. Tudo isto estaria no script das minhas reflexões previsíveis para o ano se eu não tivesse descoberto, por acaso, sobre morte de Lia em Dezembro.
Ao visitar as comunidades do Orkut (web) das escolas que trabalhei, fiquei chocado com as homenagens feitas pelos alunos para a grande professora. Os alunos do CEFET também tinham lançado, no fórum de uma comunidade, sua homenagem para Lia.
Por que só tomei conhecimento, por acaso, sobre a morte de Lia no final do ano?
Ora, tenho amigos ou contatos com pessoas que continuavam trabalhando com ela, mas, mesmo assim, ninguém tinha me dado uma pista sobre o ocorrido. O que houve? Estas perguntas me incomodavam tanto que, até mesmo porque desconfiava das respostas, perdi a noite e um pouco do equilíbrio naqueles dias.
O ser humano das recusas dos sistemas, do engajamento e da emoção, para tornar o seu cotidiano mais eficiente, conseguiu confeccionar um sistema previsível próprio...
Eu também sou uma formiga!?!?!?!?!
Tão formiga que não fazia parte mais dos espaços que acreditava pertencer. Tão formiga que, muito ocupada carregando o alimento para a toca, não observava as mudanças ocorridas em seu entorno. Enfim, tão formiga que era um alienígena nos mundos que faziam parte da minha história e, por isso mesmo, ninguém conseguia mais estabelecer elos que resgatassem a minha identidade anterior.
Conversando com outra amiga, tomei conhecimento sobre a luta de Lia, sua tristeza e fé por acreditar na vida. Por outro lado, também percebi que não fazia parte mais daquela realidade, que as pessoas não mais me reconheciam nela.
Recobrei o meu sentimento pela morte da minha colega, mas estava sozinho pra pensar sobre ela. A lembrança de Lia criou um elo maior sobre o que foi a morte de Rose. Ambas ensinaram-me coisas que não se localizam em processos técnicos, mas na fala, no toque e na invasão ou pertencimento ao outro.
Por fim, tomei conhecimento, numa roda muito popular, que ser acusado de formiga significa viver apenas pela comida e, por isso, faz-se ou submete-se a qualquer coisa. Aí está a reflexão:
faz quanto tempo que estamos vivendo apenas pela comida ou pelo dinheiro, para ser mais exato?
Como as formigas, não conseguimos mais pensar sobre o nosso processo produtivo, sobre o trabalho que realizamos e, pior, sobre o produto ou fruto desse trabalho no ambiente social. Somos os reprodutores sem pai ou mãe de uma lógica e lucro que não é nosso. Somos eternamente carregados de trabalho (e é “lindo isso!”), mas para quê ou quem?
Finalizando e mantendo o tema, adoro aquela historinha do elefante e a formiguinha!
Sem muitos problemas, rapidamente o elefante cobra da formiga serviços sexuais por ter ajudado na travessia de um rio. O legal disso é que o elefante aqui aparece não como uma figura lenta, paciente e obediente. Ao contrário, ele é tanto um transgressor da imagem do bom como a possibilidade de funcionamento de uma outra lógica numa estrutura enorme.
Sempre achei que era, por muitos motivos (inclusive o peso), este tipo de elefante. Entretanto, refletir sobre a morte impôs reformulações e metamorfoses. Impôs sem defesa a transformação na formiga, na operária reprodutora que, além da comida, necessita dos elementos confortantes da classe média para parecer segura. Impôs descansar na idéia que as pessoas não passam por nós por acaso e que, às vezes, somos o espelho de uma possibilidade de vida.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Feliz Ano Novo!

Heitor vai fazer um ano e, sinceramente, para mim seria muito difícil historiar aquilo que poderia chamar do “primeiro ano do resto da minha vida”!
Vivi todas as crises internas e me refiz de todas as formas...assisti aos modelos que escolhi e os que rejeitei para ter certeza do que buscava.
Por que ninguém me disse que era FODA!?!?
Acho que aqui mesmo já escrevi que estava tentando afastar as idéias negativas daqueles que eram pais de “criancinhas bonitinhas” e encarar com outros olhos o processo. Na verdade, acho que fiz isso, até mesmo porque Heitor nunca apresentou ou trouxe um destes problemas reclamados.
Na real, acho que o principal ponto é que as pessoas erram em avaliar situações...erram em pensar que o problema está fora, que a mudança foi trazida apenas pelo bebê.
No meu caso específico, FODA é me perceber outro!!!
Significa ser outro sem desencarnar e com algumas pendências da vida pregressa!
Sei que cada geração tem seu karma e o seu modelo de superação dele. Às vezes, isto pode se confundir em uma mesma coisa.
Por exemplo, a minha mãe que se acha uma prima próxima de Nossa Senhora (Maria). Ao mesmo tempo, o karma de sofrimento da mãe obstinada que, ciclicamente, doa o sangue pelos filhos é superado por valores e ideais superiores que se concretizam em chão e caminho para ela.
No meu caso, mesmo odiando o que vou dizer, tenho a síndrome do “Arquivo Confidencial” de Faustão. Sempre acho que um dia, estarei emocionado em uma homenagem pública com as pessoas da minha vida reconhecendo, pelo menos, a minha existência ou a diferença que fiz no mundo. Sempre acho que devo ganhar uma fita azul pelos meus feitos diários e, exclusivamente por isso, estas ações precisam ser perfeitas! Acho até que já sei minhas palavras de agradecimento...
Para não desviar do foco, como quis ganhar a faixa da certificação, tentei fazer de Heitor o modelo de bebê com todas as discussões pertinentes ao mundo que considero legal hoje e que, muitas vezes, não consigo concretizar para a minha vida.
Aleitamento exclusivo, ausência de açúcar e sal, presença de cereais e alimentação saudável ou natural, pai com emoção e dedicado, amor incondicional, não diferenciar pessoas para contatos com o bebê; babá participativa e dona de uma história/conteúdo aplicável...todas as horas dos meus dias, inclusive nos sonhos, estes assuntos estavam presentes em 2008.
Esperei como ninguém apresentar o mar ao meu bebê e fazer, deste momento, algo especial para o registro do hall de experiências inesquecíveis da vida dele (ou da minha)! Fiz isso e, apesar de um posterior relógio (a prova de água) cheio de água salgada e quebrado, acreditei mais uma vez que fazia parte do ranking dos grandes pais do mundo. Isto tudo foi tão forte em meu cotidiano que, exceto pela terapia, esqueci de quem era antes ou, melhor (para homenagear um amigo kardecista), reencarnei de novo(com outra vida, percepções) no mesmo corpo! Mudei pra caralho e continuei gordo!!!!
Bar ou boite passaram a ser coisas que existem em Nova York e, como as passagens são muito caras, motivos tão fúteis e fracos não justificam desvios da grana das fraldas ou do leite, não justificam o desconforto da alteração da rotina do bebê. Novas informações e leis no gerenciamento do projeto filho.
Por fim e, como tudo, o primeiro ano está acabando. Parece que começo a colocar (com muitos acordos, lógico!) a cabeça para fora do buraco.
Neste tempo, continuei a ginástica, andei de bicicleta um bocado, fiz uma cirurgia, compramos um carro e outras coisinhas (dividazinhas...).
Num mesmo universo, vi que estava e já era diferente! Experimentei sentimentos que há muito tempo não ousava, afinal contê-los faz parte do ideal da civilização moderna e burguesa disfarçada de esquerda.
Ah, também trepei menos! Perdi os peitos de Anne para Heitor e, incrivelmente, não estabeleci uma competição desenfreada. “Seria como tomar doce de criança!” (risos).
Mantemos o poder também na ilusão!
Acho que já ganhei a certificação! A fita azul por um ano de pai sobrevivido! Anne e Heitor já ganharam lugar certo no meu “Arquivo Confidencial”! (risos)